O Ensino de Ciências e a Qualidade da Educação
No Brasil, o ensino de ciências tem pouca ênfase dentro da educação básica, apesar da forte presença da tecnologia na vida das pessoas e do lugar central que a inovação tecnológica detém enquanto elemento de competitividade entre as empresas e as nações. Evidência da falta de atenção dispensada à formação na área de ciências neste país é o enorme deficit de docentes de física, química, matemática e biológica, calculado em 200 mil segundo o próprio Ministério da Educação.
Enquanto isso, em diversas partes do mundo, inclusive da América Latina, tem-se experimentado o impacto positivo do ensino de ciências sobre a qualidade da educação. Argentina, Uruguai, Chile, Costa Rica, Cuba detêm os melhores indicadores educacionais da região e são exemplos de países que perceberam que o ensino das ciências pode ser muito importante e produtivo.
O impacto do ensino de ciências sobre a qualidade da educação se deve ao fato de que ele envolve um exercício extremamente importante de raciocínio, que desperta na criança seu espírito criativo, seu interesse, melhorando a aprendizagem de todas as disciplinas. Por isso, se a criança se familiariza com as ciências desde cedo, mais chances ela tem de se desenvolver neste campo e em outros.
Bom ensino atrai talentos
Somente esse motivo já justificaria uma maior atenção ao ensino de ciências por parte dos formuladores de políticas públicas na área da educação, mas existem outros. Uma segunda razão é que apenas com bom ensino de ciências para todas as crianças é possível atrair talentos para as carreiras científicas.
A terceira, e última lembrada no âmbito deste artigo, é o fato de que o conhecimento científico e as novas tecnologias são fundamentais para que a população possa se posicionar frente a processos e inovações sobre os quais precisa ter uma opinião a fim de legitimá-los. É o caso do uso de alimentos geneticamente modificados, da clonagem biológica e o uso da energia nuclear. Nesse sentido, o domínio do conhecimento científico faz parte do exercício da cidadania no contexto da democracia.
Costuma-se dizer que, no mundo contemporâneo, o capital mais importante de um país é o conhecimento. O conhecimento, contudo, depende da formação de pessoas capazes de produzi-lo. E num país com as características do Brasil, com um numeroso contingente de crianças e jovens em idade escolar, não é exagerado dizer que este é o bem mais valioso que se tem à disposição, o qual pode se converter em vantagem competitiva se esse potencial for bem aproveitado por meio de uma educação de qualidade.
Falta de capacitação de docentes
Mas justamente por se almejar uma educação de qualidade é preciso atentar para um aspecto fundamental: o ensino para as ciências não consiste apenas em inserir disciplinas no currículo. Vide o que acontece no ensino médio, em que a educação para as ciências, sobretudo na rede pública, é extremamente deficiente devido, entre outras coisas, à falta de capacitação dos docentes.
Assim, a inclusão das ciências desde o ensino fundamental deve ser associada, necessariamente, a uma política de formação de docentes, de modo que eles se sintam seguros e possam propiciar aos alunos aprendizagens significativas.
Não existe nenhum fantasma no ensino de ciência, é apenas preciso transmitir conhecimentos que são até elementares e que gerem interesse das crianças pela experimentação. Os alunos se entusiasmam, querem praticar e começa a existir trabalho em equipa. No Brasil , isso acontece em escolas da rede privada, mas não é possível manter uma situação em que esse tipo de formação e conhecimento se mantenha restrito a um pequeno número de crianças e jovens, sob pena de se continuar a gerar e a reproduzir as desigualdades
Autor do artigo:
Jorge Werthein, publicado em 23/08/2006. Na época, ele estava como Assessor especial do diretor geral da Organização dos Estados Ibero-americanos – OEI.
Disponível em http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=3985&op=all, acesso em 22/04/2011.
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