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O FILHOTE

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

FUTEBOL: A HISTÓRIA REAL DO NIVALDO

Do estrelato ao ostracismo: a vida do ex-atacante do Náutico, Nivaldo.

Atacante autor do gol mais rápido da história do Brasileirão perdeu quase tudo que conquistou na carreira por causa do alcoolismo

'O mundo dá muitas voltas'. A filosofia popular ganha contornos de realidade ao olharmos a vida do ex-atacante, e ídolo do Náutico, Nivaldo. Infância pobre, sucesso no mundo do futebol, idolatria, alcoolismo e esquecimento.

Roteiro facilmente encontrado nos cinemas, que conta a história do ex-atleta, que hoje trabalha como carregador numa lavanderia. Nascido no dia cinco de fevereiro de 1977, no município de Catende, na Zona da Mata de Pernambuco, a 142 km do Recife,

Nivaldo surgiu para o futebol em 1988, quando chegou ao Náutico depois de se destacar nas categorias de base do extinto Paulistano.
A chegada ao clube da capital pernambucana foi a realização de um sonho.
- Um cara sair do interior e chegar a jogar no Náutico, um clube que eu acompanhava pelo rádio, é uma vitória muito grande. Nunca vou esquecer do dia que entrei nos Aflitos.

O lance aconteceu aos oito segundos do duelo contra o Atlético-MG. Na ocasião, o atacante recebeu a bola do meio-campo  Augusto, contou com a sorte para dominar e, da entrada da área, chutou de pé direito, para abrir o placar contra o mineiros. O jogo terminou com a vitória alvirrubra por 3 a 2, mas, para o atacante o resultado da partida pouco importa. Afinal, o grande feito da noite foi o recorde, que já dura 22 anos: o gol mais rápido do Brasileirão.

- A gente sempre tentava essa jogada nos treinos, mas nunca dava certo. Mesmo assim, decidimos fazer no jogo e dei sorte. Eu nem iria dominar a bola, que bateu no calcanhar, mas consegui fazer um belo gol, que garantiu esse feito que já dura 22 anos. A vitória ninguém comenta, mas meu feito ninguém conseguiu superar, orgulha-se.

Idolatria e sucesso
As boas atuações pelo Náutico fizeram com que o jogador virasse ídolo da torcida e ao lado do centroavante Bizu, Nivaldo formou um dos melhores ataques que o clube já viu. Com isso, o futebol do atacante passou a chamar a atenção de clubes como Corinthians, Guarani e Cruzeiro, e no inicio da década de 90 o jogador acertou sua ida para a Raposa. A negociação fez o atleta receber um ajuste salarial de mais de 300%, um dinheiro que o ex-jogador jamais sonhou em ganhar.

- Me lembro que o Cruzeiro me ofereceu muito dinheiro. Digamos que eu recebesse R$ 14 mil no Náutico e eles me contrataram por R$ 80 mil. Nunca tinha visto tanto dinheiro na minha frente, pois sempre fui de família humilde.

Na equipe mineira, Nivaldo teve a oportunidade de jogar ao lado de craques como o lateral Paulo Roberto e o meio-campo Nonato. Mas nada se compara a ter um como reserva ninguém menos que Ronaldo Fenômeno que, na época, dava seus primeiros passos no futebol. O Dinheiro atrelado ao sucesso transformaram a vida do pernambucano de origem humilde, uma celebridade.

Quando você tem dinheiro e joga bola, todo mundo abre as portas para você"
Nivaldo

- Em qualquer lugar que eu chegasse eu era reconhecido. E, quando você tem dinheiro e joga bola, todo mundo abre as portas para você. As vezes pessoas que eu nem conhecia direito me tratavam como se me conhecessem a tempo.

O Começo do fim.
Entretanto, o dinheiro e a fama não trouxeram só benefícios ao jogador. Junto a notoriedade veio o deslumbramento e Nivaldo começou a escrever seu 'epitáfio' como profissional com o consumo exagerado de bebidas alcoólicas.

O alcoolismo fez o atleta perder espaço no Cruzeiro, que tentou emprestá-lo para outras equipes. Porém, sua fama de Indisciplinado já corria no mundo da bola, e Nivaldo passou a ser rejeitado por algumas equipes. Entre elas, o Atlético-PR, que na época era comandado por Helio dos Anjos.

- Quando eu comecei a ter problemas com álcool o Cruzeiro tentou me emprestar para o Atlético-PR, mas o Hélio dos Anjos vetou a minha contratação porque sabia que eu estava com esse problema.

Sem espaço no sudeste do país, Nivaldo foi emprestado ao Sport, em 1992, que tentava formar na Ilha do Retiro, o mesmo sistema ofensivo que fez sucesso no Náutico. Para isso, foram contratados Bizu e Augusto. Mas o time não engrenou e quatro meses após sua contratação, Nivaldo foi dispensado do clube.
- O Sport tentou fazer o mesmo time do Náutico, mas infelizmente não deu certo. As vezes não conseguimos jogar o que sabemos e as coisas não funcionam. Mas sair como eu saí não foi muito bom.

Do Sport o atacante seguiu para Ponte Preta, mas seu futebol ficou longe de ser o mostrado nos áureos tempos de Náutico. Com isso, o atacante passou a atuar em pequenos clubes do futebol pernambucano, até encerrar sua carreira há três anos, jogando pelo time da sua cidade natal, Catende, pela segunda divisão do Campeonato Pernambucano.

O fundo do poço
Os constantes fracassos na carreira fizeram o atacante mergulhar de vez nas bebidas. E a receita entre alcoolismo e gastos excessivos fizeram o atleta perder quase tudo que tinha conquistado no futebol.

- Quando eu passei a jogar em times menores, comecei a gastar muito, beber muito e não ouvia ninguém. Aí, fui perdendo tudo que tinha ganho, rapidamente - confessa.
Mas o grande golpe na vida do atacante não foi uma rescisão contratual com algum clube. O atacante ficou sabendo que seu irmão, André, estava com um tumor na cabeça. Para salvar a vida do irmão, Nivaldo vendeu tudo que lhe restava, com o intuito de colocá-lo nos melhores hospitais. A iniciativa deu certo e, mesmo ficando sem nenhum bem, o jogador agradece por ter feito algo positivo com o dinheiro.

- Meu irmão teve um tumor muito grave na cabeça e eu tive que vender o restinho que sobrou do que eu tinha para salvá-lo. Mas, graças a Deus, ele está bem e eu pude fazer algo de útil com que ganhei na vida.

Fim do alcoolismo e a felicidade encontrara no carinho
Sem dinheiro, tendo que encerrar sua carreira em clubes inexpressíveis e com dificuldades para se manter, Nivaldo voltou para Catende e afundou ainda mais no álcool. Lá, o ex-atacante não sabia mais o que fazer para conseguir algo que lhe ajudasse a se sustentar. Era necessário largar o álcool e para isso ele contou com a ajuda de um 'anjo', sua filha, Ellen Samira, que na época tinha três anos.

- Um dia eu estava assistindo Náutico e Corinthians e minha menina foi assistir ao jogo comigo. O Náutico venceu por 1 a 0 e eu bebi muito e ela quem me levou para casa. Quando eu fui tomar banho, desmaiei e minha filha pensou que eu tinha morrido e começou a chorar. Foi aí, que eu vi que não podia mais fazer aquilo e fiz uma promessa para ela que nunca mais beberia e, até hoje, nunca mais bebi - garante.

Sem espaço em Catende, Nivaldo foi tentar a sorte em Toritama, polo  têxtil, no Agreste pernambucano. Na cidade, o ex-atleta arrumou um emprego na empresa Império do Forro do Bolso, mas a vida resolveu lhe pregar mais uma peça. Por causa da compra de lençóis de hospitais dos Estados Unidos, a empresa foi multada e virou manchete em todos os jornais do país. O escândalo nacional fez com que a empresa fechasse as portas e Nivaldo perdeu o emprego.

Foi aí que teve a noção do que o amor pelo clube de coração pode despertar nos torcedores. Quando ficou sabendo que Nivaldo estava de saída de Toritama, por não ter conseguido um emprego, um alvirrubro que havia vibrado bastante com seus gols, foi às rádios da cidade para fazer campanha com objetivo de arrumar um emprego para Nivaldo.

A campanha realizada por Sandro Roberto, conhecido entre os amigos como Negão, logo deu frutos e Nivaldo passou a trabalhar em uma lavanderia da cidade. O salário está longe de ser o que um dia o atleta já ganhou, apenas R$ 170 por semana, mas o ídolo alvirrubro se diz feliz com a conquista de seu maior bem: os amigos.

- Eu não esperava que fosse ser ajudado por um torcedor que nem me conhecia. Isso mostra que eu já fiz coisas boas na vida também. Antes, as pessoas se aproximavam por interesse, hoje eu consegui um bem muito melhor que dinheiro, que é o apoio e o carinho dos meus amigos e da minha família.

Mesmo se dizendo feliz, Nivaldo fica com os olhos marejados ao falar do seu clube de coração. Para ele, o Náutico poderia reconhecer mais aqueles que fizeram história no clube.

-Sempre amei o Náutico e hoje não sou nem lembrado pelo clube. Para você ter uma ideia, nem meu gol, que é um feito nacional é reconhecido. Isso me deixa triste, pois queria fazer parte do time que sempre acompanhei.
Antes de ir embora, Nivaldo fez questão de deixar um recado para os jogadores que estão começando na carreira.

- A bebida acabou comigo, me destruiu e hoje não sou metade do que um dia já fui. Então, eu espero que as pessoas não sigam meu exemplo.
Aos 43 anos, Nivaldo quer recomeçar. Então, que seja bem-vindo à vida.

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